quinta-feira, 12 de setembro de 2019

Quero recordar-me de ti...


Tributo e Homenagem Pessoal a Carlos Carranca

Quero recordar-me de ti, assim, a sorrir e com o jeito matreiro no olhar que por vezes surgia quando conseguias fintar os pensamentos das pessoas, sempre mais lentos do que os teus, sobretudo quando dissertavas sobre o que ou quem te enchia a Alma.

Quero recordar-me de ti e da tua expressão ausente quando te perdias em pensamentos de outras dimensões, no meio dos nossos burburinhos mundanos e eu troçava de teres voado sem asas em pleno almoço ou jantar na “Pensão Estrelinha” da Mãe-Lena (esse nome tão carinhoso que davas à Casa da tua família de coração na Lousã). Ou ainda ao jeito de tertúlia caseira, das larachas e das picardias trocadas com o Pai deMatos em torno das políticas actuais e de outrora ou das acções feitas e desfeitas em Coimbra ou da Briosa de antenho e de agora.

Quero recordar-me de ti e da forma peculiar como interiorizavas os poemas, assim numa declamação em surdina, para depois em momento próprio dizeres com voz possante, semblante confiante e mãos expressivas, as palavras de Torga ou de Leonel Neves, as toadas de Goes ou os teus próprios sentires.

Quero recordar-me de ti
e da forma como ficaste sensibilizado com o jeito como captei o fundamental dos teus poemas eleitos no momento em que apresentei os teus “55 Poemas de Idade” e de como eu, mera Aprendiz, me orgulhei do convite do Artista mais confiante nas minhas qualidades do que eu própria inquieta e receosa de não merecer tal honraria.

Quero recordar-me de ti guloso pelos sonhos, os com calda de açucar e os outros que orbitavam nas tuas ideias e que te transformavam em Quixote em plena Mancha de Unamuno.

Quero recordar-me de ti a receber orgulhoso o Prémio da terra, que é sempre um momento feliz quando se é reconhecido em vida, entre os seus.

Quero recordar-me de ti no quintal da Casa do Prilhão - de boina basca e capa sobre os ombros por debaixo da latada de videiras entrançadas nos kivis com o gato a rondar-te as pernas - acossado com as corriqueirices do quotidiano mas disperso em reflexões e considerações, conjecturas e perplexidades – porventura em confissões interiores ao teu “Cristo de barro” - … “já escrevi um livro inteiro na minha cabeça”… “chego à Lousã e escrevo, escrevo, escrevo, porque em nenhuma parte estou mais perto de mim…”, afirmavas, então, porque sentias que o centro da tua Pátria era aqui!

Quero recordar-me de ti com a admiração telúrica que se nutre pelo Irmão mais Velho, pelo Amigo, pelo Mestre e pelo Homem Bom, Grande no seu conhecimento universal de todas as coisas mas sobretudo da sua própria Natureza.

Quero recordar-me de ti através da grande Obra que nos legaste como testemunho e partilha da tua Humanidade, porque Assim!, o Poeta permanecerá, ficará para sempre pela Terra dizendo Cantigas para Sonhar(mos) e, dessa forma, de quem se despojou em vida, tornando-se eterno!


Para a Rosinha, o João, o Miguel, o Miguel B., a Judite B. e  a Tia Alcina B., a Sandra, a Xu e toda a demais família, com o carinho da ‘família da Lousã’.
Ana Souto deMatos
Lousã 01/09/2019

última aparição em sessão pública de Carlos Carranca no evento "Essa Palavra, Liberdade!" 
a 25 de Abril de 2019 no Museu Álvaro Viana de Lemos na Lousã 
por ocasião da comemoração dos 45 anos do 25 de Abril 



quinta-feira, 29 de agosto de 2019

segunda-feira, 5 de agosto de 2019

Ficção Científica!


Teletransporto-me para junto de ti e agarro-me segura ao teu peito firme.

Aconchegados no colo um do outro percorremos a galáxia para além da última das últimas estrelas.

Não evitamos cometas, nem colisões com os meteoros...

Uma viagem sideral para lá dos confins do universo...

Enfim, caímos na escuridão de uma nova, que nos suga e absorve no seu buraco negro até adormecermos exaustos da viagem galáctica.

sexta-feira, 5 de julho de 2019

[diálogos (2)] ...uma espécie de Marca...


- Estás com um olhar tão ausente daqui, mas tão preso num qualquer  lugar.... - A Amiga proferiu para o ar, não esperando resposta.

Do outro lado porém, assim confrontado, o olhar focou-se de novo na realidade:
- Alguma vez tiveste alguém perto de ti, tão perto… os joelhos no solo, sobre a relva... tu, sentada no banco de jardim… a sua cabeça pousada nas tuas pernas, numa atitude de dádiva, de despojo? Assim tão próximo num momento de oferta de si em silêncio “aqui estou, mostro-me a ti, recebe-me como sou. Aqui estás, mostra-te a mim, aceito-te como és”? Alguma vez, assim num-sentir-sem-palavras, na plena sintonia desse toque breve?  Apenas o rosto sobre os teus joelhos… num momento tão, tão simples mas tão, tão intenso, que os escassos  minutos se tornam marca eterna gravada no coração e no pensamento? Alguma vez? - repetiu.

Maria abanou a cabeça numa negativa sem inveja, antes de desejo de ter vivido ou alguma vez poder viver algo de semelhante….

- Eu tive esse momento… faz muito, muito tempo, mas permanece ainda… permanecerá sempre.

De permeio, entre ambas apenas o silêncio e a imaginação a galgar os anos.

Insistiu: - Será  que compreendes?
A Amiga pensou compreender!

Autoria e Agradecimento

Todos os textos e imagens são de autoria de Ana Souto de Matos.

Todos os direitos estão reservados.

São excepção as fotografias do Feto Real e do Cardo que foram cedidas pelo João Viola e 2 imagens captadas na Net sem identificação de autor.