segunda-feira, 29 de junho de 2009

Asas...

Hoje!
No dia de hoje algo mudou...
nas minhas costas
-ainda ténues e tenras-
umas asas crescem!
damo-nos a conhecer aos outros de muitas e variadas maneiras...
o que julgamos ser,
o que ansiamos ser,
o que não somos...
pelo meio...
borrifamo-nos com pós mais ou menos cromáticos de ideias e pensamentos...
compomos personagens... criamos situações...
baralhamos sistemas e processos...
complicamos e simplificamos...
somos muitos num só... ou um só transformado em muitos...
-precisamente no dia de hoje!-
o espírito nómada do varekai entranhou em mim...
ainda sinto, a espreitar-me num canto da minha mente...
o Ícaro louro e imberbe, de tez clara...
a espicaçar-me e a mostrar-me asas...
[sim! porque nesta história Ícaro não morre despaçado no chão
por conta de um sonho vão... dão-lhe final feliz junto da sua amada]
e sinto que 'em qualquer lugar' da minha própria história eu vou encontrar-me e Ser... simplesmente Ser...
porque as asas...
as asas
já as sinto!

quando a natureza se transforma numa tela...

domingo, 28 de junho de 2009

Uma noite de SONHO!

É só ter o valor certo para pagar e asseguram-se duas horas de Sonho, pensado e executado profissionalmente, ao milímetro do pormenor, por quem sabe construir imaginários de encantamento e luz…

Apesar de o Sonho ser pago –a peso quase de ouro!- sinto que vale a pena esquecer por uns cento e vinte minutos que a vida lá fora é escassa…

Viver um serão no ‘Cirque du Soleil’ é como entrar dentro do próprio sol, em algo de grandioso, de feérico. É como entrar numa enorme cabeça dimensionada ao 'plateau'… onde faunos, duendes, fadas, monstros do fundo dos mares, personagens mitológicas, outras caricaturadas do nosso quotidiano, se misturam e se interagem e se transformam num ritmo frenético e criam um espectáculo de som, de luz, de imagem, de teatro, de artes de circo elevadas à sua expressão máxima de realização… um espectáculo onde tudo se complementa e nos transmite cor, encantamento, magia, esquecimento, alegria.

E, de repente, esqueço-me da vida de todos-os-dias e abro a boca de espanto e sinto-me de novo menina pequena, cheia de ideias, com o pensamento repleto de coisas doces, de coisas boas, daquelas que aconchegam e acalentam… e perco-me, completamente, na floresta mágica de bambus, com as luzes dos pirilampos a confundir-me o olhar, as imagens tétricas de seres reinventados que misturam o real com a imaginação e nos transformam a nós, espectadores ávidos de sonhos, em personagens da história que se desenrola em palco… e a música, que é extremamente envolvente, cantada ao vivo, permite sentir que é ali –naquele preciso momento, naquele instante!- que o Sonho decorre e flui… assim como fluem pelo ar seres sem asas que permitem que o seu adejar quase nos toque os cabelos… seres que voam sobre nós, deixando que a brisa do seu rasto nos entre pelos olhos dentro, também ela, mágica. Varekai, a palavra dos povos nómadas para definir ‘em qualquer lugar’. E é aí, em qualquer lugar, que existe e encontramos o Sonho, que tanto pode ser absurdo como absolutamente extraordinário, minúsculo ou grandioso, transcendente a tudo ou apenas inerente a nós próprios…

A meu lado, a minha criança está em perfeita sintonia comigo e com o Sonho. Estamos no sítio certo e partilhamos o momento certo. Só com ela faz sentido este momento.

E por momentos, a sensação de que vivo numa outra dimensão. Esqueço-me de ovacionar… "interiorizo-me" nestes seres quase etéreos que se espraiam pelo espaço. Por todo o espaço! Porque todos os elementos se completam e se interligam, a música enche os sentidos, a luz ou a escuridão enchem os sentidos e a própria história que nos vai sendo contada nos enche os sentidos… uma história de Amor… de um Ícaro que percorrendo o céu do seu próprio Sonho, perde as asas mas alcança o sentimento máximo do amor correspondido.

Pagamos por duas horas de Sonho… espectáculos repletos –esgotados- a justificar a ideia de que o mundo, as pessoas, precisam de Sonho para viver, mas já não sabem dar vida aos seus próprios sonhos.

Vale a pena. Vale o dinheiro. Nada como entregar a profissionais, competências que já não dominamos.

Não posso tirar fotografias ao Sonho… trago-O comprimido em caixinha digital para tentar reviver e partilhar o momento… sei, porém, que nada será igual. O momento já passou.

No dia seguinte, passo pelo recinto do circo, o Grand Chapiteau… desmontam o Sonho a grande velocidade. Dezenas de contentores se perfilam no espaço para O encaixotar e levar para outras paragens distantes onde haverá outros que pagarão para O sentir por duas horas. Foram realizados os últimos espectáculos em Lisboa. Chove intensamente… desapareceu a imagem do saltimbanco, do fauno, dos peixes coloridos, dos duendes e da fada de olhos cintilantes… não há música, nem cor, nem magia… só o cinzento do céu, o branco da tenda gigante e a ponte ao fundo que entre a névoa parece uma miragem…


Na minha cabeça persiste, porém, a imagem clara quase imberbe, de um Ícaro feliz.

sexta-feira, 26 de junho de 2009

são os outros uma miragem?

as pessoas esqueceram-se de sentir...

esqueceram o modo...
no afã do quotidiano...

e a mera afirmação do sentimento é tão extraordinária...
que se torna quase algo alternativo
subversivo diria, em muitos casos

existimos para os outros
ou somos meras miragens?

quarta-feira, 17 de junho de 2009

interregno...

não quero mais a flor nem a palavra
quero a raiz ou o silêncio da terra

de Maria Toscano...

domingo, 14 de junho de 2009

a ponte é uma miragem...

Prometiam-nos vagas de calor, daquelas alterosas e incisivas na pele, sobretudo nas mais alvas como a minha que num ápice passam de ‘cara-pálida’ a ‘pele-vermelha’, numa história de mocinhas e vilãs, de índios e cowboys num faroeste reinventado…
Porém, foi o nevoeiro intenso que nos acolheu e nos abraçou numa praia completamente deserta, a justificar o desnivelamento de todo um país que se transladou para Sul, para Alentejos e Algarves de sóis e mares mais quentes, seguramente!Quiaios surgia-nos tal campo de Alcácer-Quibir com névoas densas e salpicos de mar encarpelado. Apesar de tudo, a temperatura que -com dose de boa-vontade- afirmaríamos cálida, fez-nos permanecer e descobrir o sabor do sal, sentir a frescura intensa da água no corpo e da areia batida por ondas sempre enfurecidas. Esta é uma praia que se estende langorosamente por um areal-a-perder-de-vista, verdadeira força de expressão nestes dias de tons esbranquiçados.As dunas protegidas cativam-me os sentidos. Sinto que aprendo com esta flora resistente às tempestades de mar e de terra, a crescer como mulher e a enfrentar a vida, tentando não perder o sonho!
Ousamos fazer um lanche na praia… um verdadeiro piquenique preparado carinhosamente para pinhais ensolarados. Não obstante, optamos por enfrentar o tempo e a areia e, sobre as toalhas estendidas, saboreamos a tarte de legumes, o tomate temperado, o bolo de laranja -ainda mornos da confecção matinal-, manjar desfrutado e partilhado com um horizonte inteiro só para nós e que nos obriga a caminhadas de encontro ao Cabo, ali tão perto, ali tão distante. O Cabo Mondego ergue-se altivo e crespo, batido pelas águas alterosas de correntes contraditórias. Pelo caminho, encanto-me com as bolhinhas de espuma, com a brancura das batidas do mar sobre a areia a recordar-me neves de invernos de montanha.Mas o tempo, realmente, enrola-se sobre si e sobre nós e vencidas corremos atrás do sol. Partimos na sua busca para lá das escarpas e encontramo-lo, agachado, sobre as praias de Buarcos e da Figueira da Foz… assentamos arraiais, de novo… mas na verdade não por muito tempo… um duche fumegante que nos revigora -tomado em banheiro de praia- deixa-nos cheirosas e libertas de maresias e salpicos de areia prontas para seguir para o interior, para a festa da "terrinha" (com um sorriso complacente no rosto) para a qual havíamos sido convidadas, insistentemente, com meses de antecedência… poderíamos nós lá falhar a esse compromisso nunca assumido mas interiorizado!
As novas auto-estradas permitem-nos chegar em pouco mais de uma hora a Cedrim, freguesia a 'paredes-meias' com o rio Vouga, no concelho de Sever. É uma terra já com alguma dimensão que se engalana para as suas festas… e que nos surpreende com a qualidade dos festejos. A simplicidade impera, na sua melhor expressão. Numa eira comunitária, inúmeros espigueiros –canastros, por estas paragens- servem de palco à festa. Banquinhas armadas pelas meninas e senhoras da terra, sob as latadas já cheias de cachos verdes, mostram e vendem os produtos locais, os bolinhos, as compotas, os licores, o artesanato mais tradicional e o que resulta de criatividades mais recentes. O grupo de jovens da terra anima as festividades e a organização por conta da Junta de Freguesia afadiga-se em torno da tasca de comes e bebes. Um novo jogo faz a delícias dos homens maduros e dos imberbes… em redor de um troco de madeira, os pregos com 20 cm de altura vão sendo martelados numa cadência de uma pancada, mais ou menos certeira, por jogador… o último, ficará responsável pela rodada de cerveja…
O anfitrião faz-nos as honras da casa… afinal, somos veraneantes em terra alheia, para além de que a amizade ainda tem posto por estas bandas … comemos frango e rojões e um pão com chouriço divinal ainda quente a sair do forno. É uma festa acolhedora, como são acolhedores os amigos que nos recebem.
A noite cai e no palco o espectáculo começa. Antigo ícone da música pop-rock portuguesa, um grupo liderado por Luís Portugal dos Jáfumega da minha juventude, apresenta um programa de qualidade superior que intercala rábulas com sucessos musicais mais ou menos recentes, parodiando ou elevando músicos e situações. Três homens em palco que com o seu espectáculo completo fazem vibrar a pequena multidão de Cedrim e arredores. Todos cantam, todos dançam, músicos e espectadores interagem. Ninguém se preocupa com as horas perante um Domingo, ainda tenro de minutos.
Porém, para nós uma viagem mais ou menos longa nos espera e a noite já caminha para o novo dia.

Nos ouvidos ainda nos ecoa, ao longo dos quilómetros que palmilhamos, os sons melodiosos. E para combater o sono que teima em se instalar, vamos trauteando “a ponte é uma passagem para a outra margem”…

...”a ponte é uma miragem”!
assumida verdade da minha vida...

quinta-feira, 11 de junho de 2009

o aquário...

Hoje
o mar lambeu-me os pés
galgou-me as pernas e

encheu-me a cabeça de peixes coloridos!!!

e não é o verde...

Da varanda,
o olhar prende-se mais além...
porém...

não contempla a serra.

Sente o Rio! A outra margem!
A Água!
Vê o Mar!

e não é o Verde...
é o Azul!

... que entra e
se espraia pelos olhos dentro!

terça-feira, 9 de junho de 2009

até depois...

em dias de chuva e nevoeiro
as montanhas estão impedidas
de contemplar
o horizonte!

os pássaros resguardam-se nas árvores
as flores encolhem-se sobre si próprias
a própria natureza adia a vida!

domingo, 7 de junho de 2009

excesso de natureza...

Em São Leonardo de Galafura há um excesso de natureza… como escrevia o poeta Miguel Torga, que por aqui deliciou o olhar e o pensamento e que desta natureza se extasiou e a transpôs para palavras sentidas e expressivas, também elas, excesso da sua alma grande, imensa.
Tal como eu me extasiei, conduzida pelas mãos carinhosas de amigos transmontanos que comigo quiseram partilhar a amplitude do espaço, as margens onduladas, recortadas e esfuziantes do Douro… ondas verdes, contrastando com o azul intenso do rio e a névoa acinzentada dos montes mais ao longe.

quarta-feira, 3 de junho de 2009

Montanhas...

Sempre de Jorge de Sousa Braga...
poesia a propósito de Montanhas...

1.
Quando uma montanha se apaixona tudo pode acontecer...
Começar aos saltos ou
então ficar para ali deitada a olhar as nuvens.
Convém por isso não a escalar nesses dias e
sobretudo não beber água das suas nascentes.
2.
As montanhas apaixonam-se com frequência.
Vestem-se de branco. De verde ou de azul.
Por vezes abrem as pálpebras. E a lava da sua paixão corre-lhe pelas faldas.

terça-feira, 2 de junho de 2009

saudades de ser feliz!

Tenho saudades de ser feliz...
de ser completa.

Saudades,
de olhar o caminho e a vida não apenas com os meus olhos.

Saudades
de um abraço inteiro.

Saudades de
partilhar a intensidade dos dias,
de repousar o rosto no peito e
aí adormecer tranquila
ou de entregar, sem pudor,
os medos e os choros

Tenho saudades
de me perder
de me encontrar
Saudades de ti.

segunda-feira, 1 de junho de 2009

deve haver ilhas para lá do sul das cousas...

(de Álvaro de Campos)
«Abrigo no peito, como a um inimigo que temo ofender,
um coração exageradamente espontâneo.»

Autoria e Agradecimento

Todos os textos e imagens são de autoria de Ana Souto de Matos.

Todos os direitos estão reservados.

São excepção as fotografias do Feto Real e do Cardo que foram cedidas pelo João Viola e 2 imagens captadas na Net sem identificação de autor.